20.000 a.C. | Cerâmica

Por muito tempo se acreditou que a cerâmica havia sido inventada em algum ponto do Oriente Próximo. Foi com grande surpresa que, nos anos 1960, arqueólogos descobriram jarros datados de cerca de 10.000 a.C. a milhares de quilômetros dali, no extremo leste da Ásia, em Nasunahara, na ilha de Kyushu, no Japão.

Encontrados em cavernas, foram feitos por grupos nômades, e não por povos assentados em fazendas ou aldeias. Além disso, descobriu-se que esses jarros haviam sido aquecidos ou cozidos para endurecer a argila, indicando um conhecimento avançado de tecnologias. A importância desses primeiros vasos é que eles antecedem em mil anos aqueles feitos no Oriente Próximo. Estes, encontrados no Irã, eram secos ao sol para ficarem rígidos, uma tecnologia bem mais primitiva do que a de cozinhá-los.

Cerâmica Jomon. Crédito: Wikimedia Commons

Os jarros japoneses têm a base redonda e se alargam suavemente, terminando em uma borda arredondada e fina. São conhecidos como “jomon incipientes” pois são os precursores dos vasos jomon, “com padrões de fios”, feitos no Japão em torno de 9.000 a.C. Os vasos mais recentes tinham bases estreitas e eram elaborados combinando-se “cordões” de argila. Os padrões dos vasos podiam chegar a ser bem complexos, indicando que seriam usados para rituais religiosos ou fúnebres e não para tarefas cotidianas, como cozinhar e guardar alimentos.

Por vários anos, considerou-se que estes vasos datados do período neolítico foram os primeiros artefatos de cerâmica inventados. Contudo, alguns anos atrás, fragmentos de cerâmica datados de 20 mil anos de idade foram encontrados na caverna Xianrendong em Jiangxi, no sul da China. Com essa nova evidência, argumenta-se que é negada a teoria de que a cerâmica foi inventada há cerca de 10 mil anos, período em que os seres humanos passaram de caçadores a agricultores (mais sobre isso no final do artigo).

A cerâmica é uma grande aliada para o estudo dos arqueólogos, pois ela faz parte de alguns dos materiais que resistiram ao tempo e seus achados colaboram para transmitir o modo de vida dos nossos antepassados.

A cerâmica no Período Neolítico

No período Neolítico, último período da Pré-História (também conhecido como Idade da Pedra Polida), a cerâmica passa a ser produzida não somente como peças utilitárias, mas também inicia-se uma preocupação com a beleza da cerâmica.

Nesse período iniciou-se também a criação de esculturas de metal, mas para que elas fossem produzidas, primeiramente utilizava-se um modelo feito de cerâmica, como molde. Dentro desse molde era despejado o metal derretido, e quando este esfriava, era então quebrada a forma de cerâmica.

Uma das histórias sobre o início da cerâmica diz que os homens, ao pisarem na terra molhada, observou que ali ficavam as marcas de seus pés e, quando essa terra secava, ali ficavam conservadas as suas marcas e também o formato dos pés. Eles perceberam então que a argila úmida era macia e maleável.

Foi então que resolveram fazer a queima da argila, ou seja, se ao secar a terra a forma já aparecia, quem sabe se a sua secagem fosse mais forte, com fogo, poderia ter mais resistência. Percebe-se então que o fogo é fundamental para que a argila tivesse uma consistência mais endurecida e assim aos poucos foram trabalhando com mais produtos de utilidades domésticas, bem como desenvolvendo produtos criativos com a argila, agora pensando em sua beleza.

A cerâmica no Egito

No Antigo Egito a religião era um dos aspectos mais importantes de sua cultura. Ela “invadiu toda a vida egípcia, interpretando o universo, justificando sua organização social e política, determinando o papel de cada classe social e, consequentemente, orientando toda a produção artística desse povo”.

Como os egípcios acreditavam em uma vida após a morte e que essa vida é a mais importante do que as que vivem no presente, muito de suas artes eram voltadas para esse momento da morte, dessa passagem. Assim, “a arte egípcia concretizou-se, desde o início nos túmulos, nas estatuetas e nos vasos deixados junto aos mortos”. (PROENÇA, G. p. 17).

Os Vasos Canópicos

No Antigo Egito, durante o processo de mumificação, eram retirados os órgãos internos e colocados nesse tipo de vaso. A crença egípcia se baseava no fato de que a preservação desses órgãos era muito importante para garantir a vida dos mortos no além.

Vasos Canópicos do Antigo Egito

O nome “canopo” reflete a associação equivocada dos egiptólogos com a lenda grega de Canopus, que na mitologia grega, foi o piloto do navio do rei Menelau de Esparta durante a Guerra de Tróia. Segundo a lenda, enquanto visitava a costa egípcia Canopus foi mordido por uma serpente e morreu. Seu mestre Menelau ergueu um monumento para ele em uma das bocas do rio Nilo, em torno do qual a cidade de Canopus mais tarde se desenvolveu.

Quando os primeiros egiptólogos começaram a desenvolver o seu trabalho eles denominavam qualquer vaso que tivesse uma forma humana como “canopo”. Cada um dos vasos era identificado com uma divindade, conhecidas como Filhos de Hórus: Imseti, Hapi, Duamutef e Kebehsenuef. Acreditava-se que cada um destes filhos de Hórus protegia um órgão, que eram respectivamente o fígado, os pulmões, o estômago e os intestinos. Os vasos eram colocados nos túmulos orientados para cada um dos pontos cardeais, sendo cada um deles associados a uma deusa tutelar: Ísis, Néftis, Neit e Serket.”

A cerâmica na Grécia

Na Grécia, país dedicado à beleza e estética, as pinturas aparecem como elemento de decoração. Painéis, paredes das construções, templos eram pintados como forma de beleza e também de transmissão da cultura. A pintura grega também se manifestou através da arte da cerâmica. “Os vasos gregos são conhecidos não só pelo equilíbrio da forma, mas também pela harmonia entre os desenho, as cores e o espaço utilizado para a ornamentação”. (PROENÇA, G. p. 32).

Ânfora de figura negra do ático. Atenas, Grécia
Tigela representando cenas de duelo da Guerra de Tróia. Período Arcaico Tardio. Cerca de 490-480 a.C. Crédito: Museu de Belas Artes, Boston

Os vasos pintados serviam para rituais religiosos, bem como eram utilizados como recipientes para guardar água, azeite, vinho e demais tipos de mantimentos. Mas com o desenvolvimento da produção dos mesmos e da criatividade, eles passaram a ter o seu valor artístico.

Inicialmente os vasos tinham como fundo a cor natural da cerâmica, onde se faziam as pinturas representando geralmente cenas das vidas diárias da cultura grega, bem como de sua mitologia. “Inicialmente o artista pintava, em negro, a silhueta das figuras. A seguir, gravava o contorno e as marcas dos interiores dos corpos com um instrumento pontiagudo, que retirava a tinta preta, deixando linhas nítidas”. (PROENÇA, G. p. 32).

“Por volta de 530 a.C., um discípulo de Exéquias realizou uma grande modificação na arte de pintar vasos. Ele inverteu o esquema das cores: deixou as figuras na cor natural do barro cozido e pintou o fundo de negro, dando início à série de figuras vermelhas. O efeito conseguido com essa inversão cromática foi, sobretudo, dar maior vivacidade às figuras”. (PROENÇA,G, P. 33).

A cerâmica na China

Quando se trata de cerâmica e porcelana, a China é referência no assunto desde o início até os dias de hoje. “A história da cerâmica chinesa é uma contínua experimentação de materiais, técnicas de cozedura e processos de decoração, encaminhada para uma produção cada vez mais bonita, variada e perfeita”.

Assim, como em outras regiões, no período Neolítico a China produzia peças de cerâmica utilitárias, algumas sem ornamentação e outras decoradas “através da aplicação de pigmentos naturais em vermelho e preto que podiam reproduzir motivos esquemáticos, abstratos e de animais. A produção da cerâmica doméstica manteve-se durante a Idade do Bronze e já na dinastia Qin e, sobretudo na Han, as técnicas da olaria foram utilizadas para criar formas muito variadas, figuras humanas e maquetes arquitetônicas, que faziam parte dos mobiliários funerários”.

No período da Dinastia Han várias inovações aconteceram na China, e a cerâmica chinesa passou por diversas transformações. A mais interessante foi a utilização do vidrado, um verniz à base de óxido de chumbo que, aplicado sobre a superfície da peça e cozido, criava sobre o objeto uma camada brilhante, impermeável e protetora. Este verniz, assim como outro criado posteriormente de tipo alcalino (à base de óxido de potássio e sódio), misturava-se com outras substâncias – óxido de cobre ou de ferro, por exemplo – dando às peças distintas tonalidades que potencializavam o seu valor estético”.

Mais antiga do que se pensava

Fragmentos de cerâmica encontrados na caverna Xianrendong em Jiangxi, no sul da China. Crédito: Epoch Times

Na caverna de Xianrendong em Jiangxi, no sul da China, foram encontrados fragmentos de cerâmica, como esses da foto acima, classificados como sendo de 20 mil anos. “Os antropólogos compararam a descoberta com outros exemplares de 15 mil anos atrás, portanto argumentam que com esta nova evidência é negada a teoria de que a cerâmica foi inventada há cerca de 10 mil anos, período quando os seres humanos passaram de caçadores e agricultores“.

Para se ter uma ideia da arte da cerâmica na China, em 1974, arqueólogos encontraram em Qin Ling, a 30 km a leste de Xian, 22 séculos após serem construídos, os guerreiros de Xian. “Nesse ano de 74, um camponês que furava um poço encontrou um pedaço de cerâmica. Com receio de ter feito algo errado, preferiu chamar as autoridades. Em seguida, chegaram os arqueólogos, sem muitas pretensões. Mas quando ampliaram suas buscas, eles ficaram atônitos: guerreiros e cavalos passaram a brotar da terra dia após dia”.

A cerâmica no Brasil

Antes da chegada dos portugueses aqui no Brasil, a cerâmica já fazia parte dos povos que por aqui habitavam. “Há mais de 1500 anos, os povos que habitavam a ilha de Marajó trabalhavam a cerâmica; eram pintadas em preto, branco e vermelho e decoradas com desenhos geométricos. Hoje esse tipo de cerâmica, chamada marajoara, está muito difundida no Brasil e é fabricada em oficinas de artesanato da região amazonense”.

Urna funerária Marajoara

A Ilha de Marajó é a maior ilha do Brasil, situada no Estado do Pará, localizada na Foz do Rio Amazonas, no arquipélago de Marajó. Ela se encontra no Norte do Pará, a 90 km da capital Belém. “Com cerca de três mil ilhas e ilhotas, o Marajó é o maior arquipélago flúvio-marítimo do mundo e uma Área de Proteção Ambiental (APA).”

“Somente na metade do século XIX é que a riqueza arqueológica oriunda dos povos indígenas da região começou a ser descoberta. Estima-se que os primeiros habitantes da ilha tenham vivido há 5.000 anos, mas a maior parte de seus restos habitacionais foi destruída. Os vasos e objetos de cerâmica encontrados na região, tão belos e valorizados, são considerados um símbolo do estado do Pará, por representarem a cultura nativa da região. Alguns desses objetos datam de 400 a 1350 de nossa era. Infelizmente boa parte das cerâmicas marajoaras encontra-se hoje em coleções particulares e museus da Europa, Estados Unidos e Brasil. O maior acervo brasileiro de peças de cerâmica marajoara está no Museu Paraense Emílio Goeldi e no Museu do Marajó, em Cachoeira do Arari”.

Escavações em sítio arqueológico no Pará
Escavações no Brasil

A produção da cerâmica pelos índios estava nas mãos das mulheres das tribos, responsáveis por todo o processo da fabricação das peças de cerâmicas, desde a coleta da argila, da modelagem, da queima e da pintura final. Havia uma grande variedade de produtos, tais como as urnas funerárias, brinquedos, apitos, utensílios domésticos, cachimbos, etc.


Referências

Blog da Mari Calegari

Canopic Jar. Wikipedia

Profeloarte

Canopus (mythology). Wikipedia

Point da Arte

Fundação Joaquim Nabuco

PROENÇA, G. – A História da Arte. Ed. Atica. São Paulo.

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